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Mais de 50 mil casas de São Paulo jogam esgoto em córregos mesmo com rede disponível

De acordo com a Sabesp, 1,4 milhão de litros de esgoto são descartados de forma irregular na cidade por mês. Segundo a prefeitura, a multa inicial para a não regularização é de R$ 500 por mês.

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Funcionários da Sabesp fazem vistoria em casa da Zona Sul de São Paulo (Foto: Marcelo Brandt/G1)

Mais de 50 mil imóveis da cidade de São Paulo jogam esgoto em córregos ou fossas mesmo com a rede de coleta disponível, apontam dados da Sabesp aos quais o G1 teve acesso. Isso quer dizer que, a cada mês, 1,4 milhão de litros de esgoto são descartados de forma irregular.

Em toda a área atendida pela Sabesp no estado, são mais de 180 mil imóveis “factíveis”, termo usado para os casos em que a rede está disponível, mas a ligação não é feita. Apenas na região metropolitana de São Paulo, que concentra 70% do total de clientes da Sabesp, são mais de 130 mil.

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A ligação de esgoto é obrigatória para quem reside em área urbana e tem imóvel em rua que dispõe de coletores. Isso quer dizer que as empresas responsáveis pelo setor, como a Sabesp, devem construir as redes e as estações de tratamento de forma a atender toda a população, mas os responsáveis por ligar suas casas às redes existentes são os proprietários.

A obrigatoriedade da conexão está prevista na Lei Nacional do Saneamento. No caso de São Paulo, há ainda uma deliberação da Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (Arsesp) sobre o assunto.

Proprietários devem bancar as ligações de seus imóveis

Segundo especialistas, um dos principais entraves está exatamente no fato de que os proprietários devem bancar as ligações de seus imóveis até as caixas coletoras da Sabesp – o que quer dizer uma obra de adequação da casa ao sistema de esgoto.

A falta de conhecimento sobre a situação do esgoto na casa também é apontada como um problema, já que muitas pessoas compram imóveis sem checar ou fazer modificações em suas plantas hidráulicas.

Além disso, muitos moradores apresentam resistência em se integrar à rede porque isso gera um aumento na conta de água, que dobra de valor. Uma pesquisa de 2015 do Instituto Trata Brasil sobre o assunto aponta que este é o principal motivo das não ligações de esgoto (36% dos casos).

Em um dos imóveis visitados pelo G1, uma loja em Santo Amaro, na Zona Sul de São Paulo, chamada Amazônia Movéis, o proprietário Manoel Queiroz afirmou que aluga o espaço há mais de 20 anos e que não sabe dizer se o local está ligado ou não à rede de esgoto. Segundo registros da Sabesp, não está. “Nunca tive essa informação. Já fizemos obra, mas não de esgoto”, disse Queiroz.

Prazo de 30 dias

Nesses casos, a Sabesp comunica o proprietário e estabelece um prazo de 30 dias para que o imóvel se conecte à rede. Caso isso não aconteça, o endereço é passado para a prefeitura, que realiza novas vistorias e pode estabelecer sanções. Segundo a Secretaria Municipal das Prefeituras Regionais, a multa inicial é de R$ 500 por mês, até que a ligação seja feita.

“Como é um serviço tarifado, a empresa não pode obrigar o morador a se conectar na rede e não pode fazer a ligação sem autorização do cidadão. A empresa operadora tem que esperar que o trabalho [de pressão] seja feito ou pela prefeitura, que é a primeira instituição a lutar por isso [saneamento], ou pelo Ministério Público, que pode notificar o cidadão”, afirma Édison Carlos, presidente executivo do Instituto Trata Brasil.

No caso específico da loja de móveis, não foi possível identificar para que local o esgoto está sendo desviado. Geralmente, são feitas fossas ou ligações irregulares para galerias de chuva.

Este é o caso de uma casa visitada pelo G1 no Jardim Cordeiro, também na Zona Sul. Por meio de um teste de corante, foi possível ver que a água do vaso sanitário estava caindo diretamente na galeria de chuva da rua. Isso quer dizer que os dejetos vão parar no córrego Canumã, que passa por ações de despoluição.

O proprietário não estava no local no momento da vistoria, mas informou por telefone que também não tinha informações sobre o destino do esgoto.

“Muita gente não tem informação nenhuma. As empresas podem fazer mais do que fazem, principalmente por meio de conscientização do cidadão. Os prefeitos também devem fazer mais ações de informação e devem cobrar o morador. Além disso, as pessoas têm que cumprir seu papel de cidadania”, diz Édison Carlos, do Trata Brasil.

Segundo a promotora Cláudia Fedeli, do Ministério Público de São Paulo, um inquérito civil sobre o assunto foi aberto em setembro de 2016. “Queremos fazer um termo de ajustamento de conduta entre a Sabesp, o Ministério Público e a prefeitura, estabelecendo uma uma colaboração”, afirma.

De acordo com ela, o próximo passo é que a Sabesp forneça para a prefeitura um cronograma de como serão feitas as autuações, priorizando os grandes geradores, que são comércios e indústrias. “Em um segundo momento, iremos para os médios, que são casas de classe média e média alta. A terceira categoria não irá ser intimada, pois são os pequenos geradores que muitas vezes não têm condições financeiras de fazer as ligações. Eles serão incluídos em programas sociais”, afirma Fedeli.

A promotora afirma que a ideia não é punir os moradores, mas, sim, resolver o problema ambiental.

“Se a pessoa realmente não tem condição, é importante que ela seja informada e encaminhada para algum programa. Afinal, a obrigação não é apenas do indivíduo. Também é dever do estado e da cidade cuidar do meio ambiente”, diz a promotora Cláudia Fedeli.

É neste ponto que Samanta Souza, diretora comercial da Sabesp, insiste. “O esgoto é um benefício coletivo. Não é que nem consumo de água, pois água é para a sua família. Se fizer o descarte inadequado do esgoto, prejudica todo o entorno, toda a sua comunidade. Cai na água pluvial e polui o córrego que está próximo da sua casa”, diz.

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Corante revela se imóvel fez ligação à rede de coleta ou se esgoto é levado para galeria de chuva (Foto: Simone Gonçalves/ G1)

Além dos danos ambientais, Édison Carlos destaca também os danos econômicos e sociais, já que dinheiro público foi utilizado para construir a rede.

“A tarifa remunera a construção. Quando um morador se recusa a entrar na rede, ele causa esse impacto. Nem todo o volume projetado passa pela rede e chega na estação, e a empresa não consegue viabilizar o investimento que fez”, diz Carlos.

Sobre o custo das obras, Souza argumenta que a Sabesp e o governo do estado têm o programa “Se liga na rede”, que executa as obras dentro de imóveis de família de baixa renda, de até três salários mínimos. O cliente paga uma tarifa social de aproximadamente R$ 14 para água e esgoto – a tarifa normalmente é de R$ 44 para casas. Porém, ela afirma que 40% ou menos das ligações factíveis se encaixam no perfil de baixa renda.

“Temos ainda muito consumidor de alta renda que não se conecta, como em Campos do Jordão, que tem condições plenas de o fazer e não o fazem”, diz.

Na cidade do Vale do Paraíba, que tem quase 6% de ligações “ociosas”, a Sabesp e a Prefeitura notificaram por carta os proprietários das casas com descarte irregular. A multa pode chegar a R$ 12,5 mil no caso de comércios, e o prazo de regularização termina em novembro.

A equipe de reportagem visitou um desses comércios da cidade, uma loja de motos. Apesar de constar do radar da Sabesp, um teste no local demonstrou que a ligação já estava feita. Um dos proprietários, Paulo Celso dos Santos, disse que notou os benefícios, já que a loja está localizada há poucos metros de um curso d’água que recebia o esgoto. “Antes, ficava um cheiro insuportável”, contou.

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Oficina de Paulo dos Santos fez a ligação de esgoto do comércio à rede (Foto: Simone Gonçalves/ G1)

Diferenças regionais

Os mais de 54 mil imóveis factíveis de São Paulo representam 1,8% do total. Apesar do percentual, Souza destaca que, considerando o total de esgoto que é jogado em córregos, o peso ambiental é grande, e que o número sempre deve tender ao 0.

Algumas regiões mais centrais de São Paulo, como Sé (0,1% de ligações factíveis) e Jardins (0,04%), já estão bem próximas de zerar. Regiões mais periféricas, porém, apresentam desafios ligeiramente maiores, como Pirajussara (7,16%) e Pirituba (5,14%). Considerando a Grande São Paulo, os índices sobem mais ainda, chegando a 16,55% no caso de Vargem Grande Paulista.

“A principal correlação é a idade de disponibilização das redes. A expansão é do centro para fora, então há um maior número de ligações nas regiões centrais”, diz Souza.

Além da Grande São Paulo, a Baixada Santista tem o maior número de clientes que podiam estar levando o esgoto para tratamento e não o fazem – quase 13 mil. As piores cidades são Mongaguá (4,3%) e Praia Grande (4,04%).

Em Praia Grande, o alto percentual é justificado pela Sabesp por conta da expansão populacional que a cidade sofreu nos últimos anos. “Quando acaba de instalar a rede, tem toda uma dinâmica para fazer a ligação, e isso demora um tempo para ficar pronto, para fazer as adequações com o cliente. Esse é o caso de Praia Grande. Houve expansões recentes”, explica Kleber Castilho Polisel, superintendente da Sabesp da Baixada Santista.

Para solicitar a ligação à rede disponível, o proprietário deve entrar em contato com a Sabesp antes de iniciar a instalação do ramal interno para saber a localização e a profundidade da rede de esgoto. Depois das intalações, uma vistoria deve ser agendada para que a ligação seja efetivada.

Fonte: G1.

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