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“A água influencia conflitos políticos”, diz brasileiro presidente de Conselho Mundial

Benedito Braga organizará no país, em 2018, o oitavo fórum dedicado ao tema e afirma que recursos hídricos devem ser mais debatidos nas conferências sobre o clima.

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À frente do Conselho Mundial da Água, o brasileiro Benedito Braga falou com exclusividade ao GLOBO sobre os desafios para proteger os recursos hídricos, no Brasil e no mundo.

Por que o país merece sediar o Fórum Mundial da Água?

O Brasil, ao longo das últimas décadas, deu muita importância para a gestão dos recursos hídricos. Criou um comitê dedicado às bacias hidrográficas no final da década de 1990 e, depois, a Agência Nacional de Águas, para a resolução de conflitos ligados a este recurso natural. Nossa economia é movida por hidrelétricas. Temos em nosso território a Amazônia, um grande reservatório de água. Então, faz sentido que, após sete edições, o evento seja realizado pela primeira vez no Hemisfério Sul.

A qualidade da água costuma ser um tema suficientemente discutido nas conferências do clima?

Não. Esses encontros têm se concentrado mais na discussão sobre energia. Na convenção do ano passado, em Marrakesh (Marrocos), o foco foi a mitigação do efeito das mudanças climáticas, e isso envolve principalmente o debate sobre a produção de gás carbônico por combustíveis fósseis. Fala-se pouco sobre mecanismos de adaptação e sobre a maior capacidade para reserva de água nas bacias hidrográficas.

A escassez de água é uma questão geopolítica?

Há uma possibilidade de que a água tenha relação com conflitos políticos. Obras de infraestrutura na Etiópia podem interferir na quantidade de água do Rio Nilo que chega no Egito. Turquia e Iraque também têm problemas para compartilhar os recursos dos rios Tigre e Eufrates. A Síria sofre uma seca inédita — evidentemente, este fenômeno não é o principal fator ligado à guerra civil que acomete o país, mas certamente exerce um papel.

O Brasil tem 12% da reserva de água doce do mundo. Como podemos proteger este recurso?

Temos duas grandes bacias hidrográficas compartilhadas com países vizinhos que exigem cuidados — a do Prata, dividida com Paraguai, Uruguai e Argentina, e a da Amazônia. Esta é a mais crítica, porque o rio, antes de chegar aqui, passa por outras nações. Então, se estes locais promoverem mudanças, como a construção de reservatórios, certamente haverá repercussão no Brasil. Mas não acredito que estes recursos estejam ameaçados. Ao contrário de minerais preciosos, como ouro e prata, a água não pode ser transformada em commodity. Não é economicamente viável tirá-la daqui e, depois, enviá-la para outra região do planeta. Em vez disso, nosso debate deve ser centrado no modo como usamos a riqueza hídrica, ou seja, o quanto é possível mexer no ambiente e o espaço que precisamos manter em sua forma original.

Como devemos discutir a preservação da água no campo e na cidade?

São desafios diferentes. No campo, 70% deste recurso é usado na produção de alimentos. Precisamos gerenciar esta atividade e aprender a aplicar racionalmente fertilizantes e pesticidas. No caso da cidade, trata-se de uma gestão integrada entre programas de habitação e de recursos hídricos, já que há pessoas que ocupam áreas à margem dos rios. E a água tem um papel muito importante para a saúde da população, porque influencia a qualidade do saneamento básico.

O Brasil é muito elogiado em fóruns internacionais por ter a matriz energética baseada em hidrelétricas, uma fonte de energia limpa, mas também há críticas sobre a forma como certas áreas são alagadas, além de um lobby cada vez maior por fontes renováveis, como solar e biomassa. Estamos seguindo o caminho certo?

Qualquer obra de engenharia afeta o meio ambiente, mas devemos continuar investindo em hidrelétricas. Sua construção foi muito modificada nos últimos anos — há uma preocupação crescente com o impacto ambiental e com a compensação financeira das famílias que devem ser removidas. Ainda temos um imenso potencial que precisa ser explorado. Obviamente, outras fontes de energia devem ser incentivadas. No Nordeste, por exemplo, em áreas onde há muita ocorrência de ventos, faz sentido explorar a energia eólica.

Fonte: G1.

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