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Avaliação da desnitrificação em filtro anaeróbio e reator UASB

Resumo

O nitrogênio é um elemento essencial para o crescimento de organismos, porém, quando em excesso no meio aquático, pode causar eutrofização do meio, mortandade de peixes e na forma de íons nitrato, pode ser responsável por provocar a meta-hemoglobinemia. A desnitrificação é uma alternativa para remoção de nitrato presente em efluentes. Sendo assim, nessa pesquisa, reatores do tipo filtro anaeróbio (FA) e reator UASB em escala de bancada operando com tempo de detenção hidráulica (TDH) de 12 h foram alimentados com efluente sintético enriquecido com nitrogênio na forma de nitrato (N-NO3 – ) nas concentrações de 0,0; 25,0; 50,0; 75,0 e 100,0 mgN-NO3 – L -1 (etapas 2 a 6) de forma a comparar a eficiência do processo de desnitrificação entre eles. Além disso, foram avaliadas as características hidrodinâmicas dos reatores em cada situação estudada, o biogás produzido e alterações no lodo de cada reator. Durante as etapas 2 a 5, ambos os reatores apresentaram desnitrificação completa apesar da remoção de 85,8 ± 3,6 % de DQO no FA ser significativamente maior que a remoção de 75,1 ± 5,1 % no UASB. Durante a etapa 6, com aplicação de 100,0 mg N-NO3 – L -1 e relação DQO/N-NO3 – igual a 4,4, o processo de desnitrificação foi incompleto em ambos os reatores, sendo que o FA apresentou-se melhor eficiência, com remoção de N-NO3 – de 87,9 ± 5,2 % contra 83,3 ± 4,5% no UASB. Com relação ao biogás produzido, durante a etapa 2, obteve-se o biogás tipicamente produzido pela digestão anaeróbia, com concentrações de CH4 próximas de 70% e de CO2 próximas de 13% em ambos os reatores. Já durante a etapa 6, o composto predominante foi o N2, correspondendo a mais de 85% da composição do biogás no FA e UASB, reduzindo assim seu potencial energético. O perfil hidrodinâmico do FA não foi significativamente modificado durante as etapas de desnitrificação, já no UASB, observou-se aumento do comportamento de mistura no decorrer das etapas de operação, devido à produção do biogás e ao crescimento disperso da biomassa. Os ensaios desnitrificantes realizados com o lodo dos reatores ao final da etapa 6 indicaram que a biomassa do UASB apresentou maior potencial de consumo de N-NO3 – comparada ao lodo suspenso do FA. Entretanto, no FA há uma importante contribuição dos micro-organismos no biofilme aderido ao meio suporte, os quais foram um dos responsáveis por garantir a melhor eficiência do processo de desnitrificação nesse reator.

Introdução

O Brasil vem se consolidando no tratamento anaeróbio de esgoto doméstico. Na região de Campinas (São Paulo), dentre as 24 unidades em operação pela companhia de saneamento local (SANASA), 6 delas utilizam o reator UASB em uma das etapas de tratamento e 5 utilizam filtros anaeróbios (SANASA, 2015). Da mesma forma, nos estados de Minas Gerais e Paraná, a COPASA e a SANEPAR possuem diversas estações de tratamento que utilizam em pelo menos uma das etapas a tecnologia anaeróbia, incluindo a ETE Onça e Atuba Sul, as maiores estações de tratamento em Belo Horizonte e Curitiba, respectivamente (COPASA, 2015; SANEPAR, 2015). Isso exemplifica o investimento do país nesse tipo de tratamento, contribuindo para o surgimento de mais pesquisas relacionadas a ele.

Segundo Noyola et al (2012), a tecnologia anaeróbia via UASB é a terceira mais utilizada na análise de 2734 plantas municipais em seis países da América Latina e Caribe. No Brasil, é a segunda tecnologia mais utilizada, correspondendo a aproximadamente 30% das plantas estudadas. Além disso, o tratamento anaeróbio vem ganhando importância em aplicações industriais, como parte do tratamento de efluente de cervejarias, destilarias, indústrias químicas e de alimentos, bem como efluente doméstico em todo o mundo (FANG, 2010; ERSAHIN et al, 2011). Ressaltam-se ainda vantagens como aumento da eficiência de remoção de DQO e menores investimentos e custos operacionais quando a tecnologia anaeróbia é acoplada ao tratamento aeróbio (CHAN et al, 2009).

Apesar das constantes pesquisas em tratamentos anaeróbios, o tratamento realizado na prática no Brasil ainda é baseado, em geral, somente na remoção da matéria orgânica e pouco avanço é realizado em tratamentos para remoção de nutrientes além dos níveis exigidos pela legislação. Além disso, algumas atividades industriais são responsáveis por produzir efluentes com alta carga de nutrientes na forma nitrogenada, como efluentes petroquímicos (SANTAELLA et al, 2009), indústria frigorífica (USEPA, 2002), efluentes de curtumes (SOUZA, 2007), da parbolização do arroz (FARIA, 2006). A remoção somente da matéria orgânica, portanto, já não é mais suficiente para garantir o tratamento de tais águas residuárias.

A legislação brasileira define pelas resoluções CONAMA 357 (2005) e CONAMA 430 (2011) os padrões de lançamento de efluentes em corpos receptores, limitando a concentração de nitrogênio amoniacal total ao valor de 20,0 mgL-1 , mas este limite não contempla lançamento de esgotos sanitários. Além disso, não há exigências com relação à concentração de nitrogênio na forma de nitrato (N-NO3 – ) e de nitrito (N-NO2 – ) para o lançamento do efluente, apenas há o limite de concentração de 10,0 mg N-NO3 – L -1 e de 1,0 mg N-NO2 – L -1 nos corpos de água doce classes 1 a 4.

Entretanto, é necessário preocupar-se também com os níveis de nitrato e nitrito no lançamento de efluentes em corpos d’água. Na Europa, o requisito para descarga de estações de tratamento de águas residuais em zonas sujeitas a eutrofização é definido como 15,0 mgL-1 para um equivalente de população (e.p) de 100.000 e 10,0 mgL-1 para e.p superior, considerando a concentração de nitrogênio total (EU, 1991). Nos Estados Unidos, concentrações iguais ou menores que 3,0 mgL-1 de nitrogênio total estão se tornando cada vez mais comum (USEPA, 2009).

O consumo de águas ricas em nitrato pode ocasionar a meta-hemoglobinemia, doença conhecida como síndrome do bebê azul, problemas estomacais em adultos e até mesmo câncer (USEPA, 2009). Além disso, o nitrogênio pode levar à eutrofização dos corpos hídricos, causando a floração excessiva de organismos fitoplanctônicos. Essa floração representa um sério problema para estações de tratamento de água, pois podem causar perda de carga nos filtros e alteração no odor e sabor da água tratada (CETESB, 2013). Além disso, a cortina de algas formada diminui a oxigenação do meio, uma vez que impede a passagem de luz e diminui a fotossíntese pelas plantas do fundo do corpo d’água, causando assim alterações de pH, mortandade de peixes e outros organismos.

A preocupação aumenta sabendo-se que o processo de eutrofização está diretamente relacionado com a densidade populacional da região. Prado e Novo (2006) realizaram uma análise espaço-temporal da relação do estado trófico do reservatório de Barra Bonita (SP) e concluíram que a degradação da qualidade da água se deve às alterações no uso e cobertura da terra e ao aumento populacional, que vem ocorrendo na região de Campinas (IBGE, 2010).

Nesse contexto, ressalta-se que as agências ambientais tendem a restringir a concentração dos compostos nitrogenados aceitáveis nos corpos hídricos, demandando o uso de processos desnitrificantes para sua remoção do meio líquido. Levando em conta o avanço da aplicação de reatores anaeróbios no Brasil, faz-se então necessário aprimorar o estudo da desnitrificação neste tipo de processo de tratamento.

A avaliação da desnitrificação em reatores do tipo Filtro Anaeróbio (FA) foi realizada de diferentes formas por autores como Polprasert e Park (1986), Silva et al (2015) bem como em reatores UASB por autores como Hendriksen e Ahring (1996) e Zhao et al (2015). Considerando o processo realizado por Silva et al (2015), a técnica empregada consistiu em realizar a combinação do efluente nitrificado em filtro de areia com o esgoto bruto em diferentes proporções antes da entrada do filtro anaeróbio desnitrificante.

Essa é uma técnica comumente empregada, uma vez que o efluente bruto atua com o fornecimento da fonte externa de carbono devido sua alta carga de matéria orgânica. Outras fontes exógenas de carbono como o acetato, metanol etanol, glicose podem ser utilizadas para possibilitar o processo da desnitrificação, em diferentes reatores.

Apesar de pesquisas sobre o processo de desnitrificação datarem mais de 25 anos, a comparação da eficiência de remoção do nitrogênio entre os reatores filtro anaeróbio e UASB operados sob as mesmas condições ainda não foi avaliada.

Sendo assim, o presente trabalho visou comparar os reatores do tipo filtro anaeróbio e UASB atuando na desnitrificação de meio sintético, simulando a recirculação de efluente nitrificado para reator anaeróbio em tratamento secundário. Além da avaliação da remoção dos compostos nitrogenados a pesquisa também buscou compreender possíveis interferências nas características hidrodinâmicas dos reatores, nas características dos lodos existentes e na qualidade do biogás produzido devido ao processo de desnitrificação.

As hipóteses do estudo foram:

(…)

Autora: Taína Martins Magalhães.

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